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Rui Maria Pêgo: “Houve coisas que não me foram dadas por eu ser gay”

“Viver com um segredo é tu medires o que fazes e medires o que fazes é não seres livre", disse Rui Maria Pêgo.

Ana Ramos
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Rui Maria Pêgo foi um dos convidados de Maria Botelho Moniz no programa “Goucha” desta terça-feira, na TVI, onde recordou a adolescência e falou sobre a homossexualidade.

O locutor começou por falar do seu fascínio pelo Harry Potter, que foi “fundamental” na sua existência e na sua “construção como pessoa”: “O meu sonho era entrar na nova série do Harry Potter que está a ser feita”.

“É uma história em que podes ser quem tu quiseres e és protegido por ser um outsider, podes inventar o que tu quiseres. Sentia, de alguma maneira, que não fazia parte de lado nenhum e aquilo era uma maneira de eu fazer parte de alguma coisa e acho que isso é mágico”, afirmou Rui Maria Pêgo.

Os pais, acredita, fizeram “um ótimo trabalho com todos”: “Acho que, hoje em dia, há coisas que se dizem que limitam a tua expressão de alguma maneira e acho que também tive de combater esse conservadorismo que não sabíamos o que era. Era só a maneira como se educavam as crianças nos anos 90 e agora é diferente”. “Acho que sempre pude ser o que queria ser em casa, na escola, talvez não”, contou.

Rui Maria Pêgo referiu que um adolescente com um segredo “vive nas trevas, vive sozinho”: “Não há nada pior, porque isso faz com que tu fiques paranoico, paranoica ou ‘paranoique’ com tudo aquilo que fazes, com os teus gestos… e eu, sendo homossexual e estando numa escola conservadora e num meio conservador, ser alguma coisa diferente da norma torna-te objeto de algum tipo de atenção extra”.

“Embora eu seja espampanante numa série de coisas, às vezes, não queres essa atenção toda e não queres que as pessoas te persigam, te batam e que te façam mal”, acrescentou, acreditando que foi “muito protegido pelo facto de ter pais que tinham nomes conhecidos”, o que também fez com que fosse “um alvo” na adolescência.

“Viver com um segredo é tu medires o que fazes e medires o que fazes é não seres livre, numa altura em que tens é de ser livre e tens de experimentar, explorar… esse filtro é, depois, uma coisa que tu demoras a vida inteira para tirar”, continuou Rui Maria Pêgo.

Rui Maria Pêgo revelou que, durante “muitos anos”, defendeu-se em televisão, “quando a única coisa que interessa em televisão é ser autêntico”.

“Acho que somos os maiores opressores de nós mesmos e, portanto, fingir que isso não é verdade é estar a pôr as culpas nos outros e na sociedade”, sublinhou, referindo que, “nos últimos anos”, tem tentado resolver essa questão.

Quando contou que era homossexual, Rui Maria Pêgo disse que foi um peso que saiu de cima, já que “o medo” que tinha era “paralisante”, além da “vida dupla” que levava: “Tens aquelas coisas clássicas… eu achava que só me apaixonava por mulher, mas, sexualmente, sentia-me atraído por homens”. “As coisas que nós inventamos para sobreviver… mas tudo isso são táticas de sobrevivência que, de alguma forma, servem um tempo, mas que não pode formar tudo aquilo que tu és e para onde tu vais. Depois, tens de te desfazer disso”, garantiu.

“A sociedade está ordenada de uma maneira heteronormativa e, durante muito tempo, o facto de dizer em televisão que tinha um namorado era impensável. Foi-me dito, não sei quantas vezes, que a minha carreira acabava por eu ter dito que era gay, Houve coisas que não me foram dadas por eu ser gay e houve outras que também me foram dadas talvez por isso”, contou.

“Há zonas subterrâneas nos canais e também tem a ver com os tempos. Se calhar, em 2008/2009, isso era uma coisa muito mais pesada do que em 2023. Não houve nada ostensivo, mas a minha contratação para um canal, até há quatro ou cinco anos, não era pacífica, porque isso implicava ‘Ok, ele é esta pessoa, ele significa isto’”, explicou Rui Maria Pêgo, indicando que foi “das poucas pessoas que, abertamente, fala da vida privada, que não é a vida pessoal”. “O facto de eu ser homossexual faz parte de quem eu sou”, acrescentou.

Rui Maria Pêgo também falou sobre as alturas em que se pronuncia publicamente sobre estas temas. Hoje em dia, não recebe tantas mensagens de pessoas que precisam de ajuda como antes e não sente que tem o dever de falar sobre a homossexualidade nas redes sociais.

Em 2016, o locutor pronunciou-se sobre o tiroteio que aconteceu numa discoteca em Orlando, nos EUA. “Foram mortas porque eram gays e trans e tudo aquilo que há no meio. Foi um ataque que foi concertado com esse intuito. Portanto, fingir que não é assim… porque o ódio mata, não é mentira. Portanto, faz-me alguma confusão quando as pessoas dizem ‘Achas que devíamos falar sobre isto?’. Acho, sempre vou achar, porque há muitas zonas onde há muitas pessoas que ainda vivem com medo, porque não têm vidas tão privilegiadas quanto eu tenho”, comentou Rui Maria Pêgo.

“Não sinto o peso de ter de me pronunciar sobre cada coisa que acontece, mas acho que, quando é mesmo importante, tenho de me posicionar, sim. Acho que é importante”, rematou.

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