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Nuno Pereira sobre reportagens na Ucrânia: “Ainda não me consegui desligar”

"Ainda não fiz a minha melhor reportagem", disse Nuno Pereira.

Ana Ramos
5 min leitura
SIC

Nuno Pereira foi, no ano passado, um dos enviados especiais da SIC à guerra na Ucrânia e esteve, esta segunda-feira à conversa com Júlia Pinheiro sobre tudo o que viveu e também sobre a sua carreira, que já conta com 27 anos de jornalismo.

O jornalista passou “cinco meses fora de casa a trabalhar”: “Custa-me mais porque eu sei que lhes custa a eles. Agora é assim, eu vou na mesma com o mesmo entusiasmo de sempre fazer a mala para ir para o ‘Olhá Festa’, fazer a mala para ir para a guerra. Até me esqueço que vou embora de casa”.

“Tenho esse grave defeito, se calhar, é um defeito, eu ainda não fiz a minha melhor reportagem. Para mim, nunca está bem e vou sempre em busca de fazer aquela que me deu mais prazer fazer e acaba por, às vezes, ser frustrante. É frustrante levares palmadas nas costas só porque as pessoas têm simpatia por ti e tu sabes que aquilo não foi o teu melhor trabalho e até está muito longe de ser sido o teu melhor trabalho”, comentou Nuno Pereira.

Júlia Pinheiro não concordou com o que o jornalista proferiu e sublinhou a qualidade dos seus trabalhos: “Aquilo que tu fizeste em 2022 só um repórter de excelência, alguém com uma inteligência emocional superior consegue fazer porque tu vestiste várias peles. Mas não se passa de uma pele para a outra sem ficarmos um bocadinho em ferida num sítio qualquer e de certeza que isso te aconteceu”.

“Tens muitas alturas em que te sentes muito mal, quando te vem à memória. É difícil tu desligares. Eu ainda não me consegui desligar e já me vim embora da Ucrânia há nove meses. E não consigo desligar, não dá para desligar, não consigo desligar daquela realidade, não consigo desligar daquelas pessoas que conheci… E tu, não conseguindo desligar, aquilo está constantemente aqui e, quando tu entras numa festa, num arraial, de vez em quando te vem à memória, ou vês uma matrícula ucraniana. (…) Isso atrasa-te um bocadinho o dia, faz-te pensar”, sublinhou Nuno Pereira.

Nuno Pereira acredita que é “como uma adição”: “E isso é perigoso e eu não tinha a noção disso. Não tinha a noção de que isso acontecia ao repórter de guerra, repórter na guerra, ou repórter numa guerra e aconteceu-me”.

Nuno Pereira contou que costumava falar com “pessoas com mais experiência” e que houve quem lhe dissesse: “Ok, está feito. Tens de te vir embora porque tu vais ficar viciado nisso. Eu ouvi tu contares-me a história que acabaste de fazer, ainda não está montada, vai para o ar amanhã e tu não pensas em mais nada na tua vida que não seja nisso. Por isso, se tu não vens embora, podes correr o risco de ficar aí”.

“Nesse caminho que é chamada a ‘estrada da morte’, deu para pensar isso e com o Zé deu para falarmos sobre isso que: ‘Ok, vamos a Portugal. A ideia era vir um tempo a Portugal, até porque eu tinha o ‘Olhá Festa’ para fazer’. E, depois, e até foi o acordo meio em brincadeira com a Marta Reis, a nossa subdiretora de informação, que foi excecional o tempo todo que eu lá estive”, relatou Nuno Pereira, referindo que fez um acordo de voltar à Ucrânia.

“Ela, para me convencer a vir embora, disse: ‘Ok, vens aqui, vens fazer o «Olhá Festa» e, depois, vais outra vez’. O que acabou pro não acontecer. Eu andei a alimentar essa esperança de voltar o mais depressa possível, mas acabou por nunca acontecer. Depois, também se meteram outros projetos”, rematou Nuno Pereira.

Veja aqui uma parte da conversa.