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Matay fala de episódio de racismo em Lisboa: “O que é que fiz para merecer isto?”

A Televisão
6 min leitura

O cantor Matay esteve à conversa com Daniel Oliveira no programa ‘Alta Definição’, na SIC.

Daniel Oliveira recebeu o cantor Matay no programa ‘Alta Definição’. O artista recordou memórias de infância, família e fases boas e menos boas da sua vida.

O cantor, de 34, destacou um episódio que aconteceu durante uma saída à noite, com amigos, em Lisboa.

Éramos quatro pretos e um branco. Veio a polícia e manda-nos encostar à parede. Perguntei porquê e disseram que nos enquadrávamos na descrição do grupo para o qual eles estavam ali. E ao branco que estava connosco, disseram-lhe que ele podia ir para casa. Questionei porque ele estava connosco, era nosso amigo, vai para casa porquê? E ele revoltado também, ficou do outro lado do passeio. Pediram-nos para ficarmos voltados para a parede. Eu não me virei para a parede, isso não. […] Recusei-me“, começou por relatar.

Trabalho todos os dias, venho aqui sair, divertir-me, e sou encostado à parede por nada, ninguém me diz porquê. Disse-lhe que se fiz alguma coisa, para me levarem para a esquadra. […] O que é que fiz para merecer isto? Fomos identificados e fomos embora sem nenhuma explicação. E aí eu já era adulto. […] Não se faz. E isto foi aqui, cá em Portugal“, afirma.

Falta de comida

O cantor é filho de pais separados e confessou que “não tem memória dos pais juntos”. Em casa do pai nunca faltou comida, “mas em casa da mãe era mais difícil”.

Tínhamos apoios, as associações onde íamos buscar comida, e aí era difícil. Não faltava porque a minha mãe era batalhadora. Mulher de guerra. Uma sandes de fiambre, por exemplo, se calhar não era tão fácil, mas havia um pão com manteiga. Era o que havia”, recordou Matay.

Aprende-se a viver desta forma e a dar graças a Deus”, acrescentou.

Entre as muitas memórias, Matay falou sobre uma situação em que um dos irmãos “estava a brincar na rua e houve uma mãe de um miúdo que da janela disse: ‘então estás a brincar com esse preto’”.

Tens que sobreviver, vais aprender de dia para dia o que é que tens de fazer, que caminhos tens de fazer para conseguires continuar cá. Não sinto raiva de ninguém. É tu conseguires depois dar seguimento à tua vida porque isto são coisas que… fazem parte da minha vida”, desabafou.

“Quantas vezes estava sentado [no autocarro] e vinha alguém que dizia que eu tinha que me levantar. [Eu respondia]. Nunca fui pessoa de aceitar abusos”, notou Matay.

Daniel Oliveira questionou o convidado sobre “quando é que passou a sentir orgulho da sua cor”, Matay respondeu: “É difícil ao ponto de precisares de viver um processo de aceitação. E perceberes que não és menos. Não tens só uma luta exterior, também é interior. Não é só aquela coisa de ser o preto que venceu, é sentires que realmente estás a fazer uma coisa bem feita e valorizares-te por isso. E sentires que o facto de seres preto não te diminuiu em nada”.

Felizmente tenho várias coisas que faço que me deixam orgulhoso. […] E estas pequenas vitórias ajudam-me a valorizar aquilo que sou, quer seja preto, branco ou amarelo. Depois há outro lado, que é o lado na comunidade. E aí é quase como uma missão minha também de tentar mostrar, primeiro eu não cheguei aqui por ser melhor que ninguém, sou como tu, temos a mesma cor. Se eu consegui, tu também consegues”, acrescentou.

História feliz que viveu com os filhos

Matay recordou uma história muito feliz que viveu com os filhos, Vicente e Santiago.

Há dias estava a brincar com os meus filhos, que estavam a jogar à bola, e um senhor de 92 anos pediu a bola ao meu filho e ficou a jogar à bola com ele. E vias claramente brilho naquele olhar, coração bom. Isto também se vê. Agora perguntas-me, um senhor com 92 anos vem de um outro tempo, se calhar de um tempo em que esta questão da cor estava muito presente… Ele não mudou agora“, contou.

“[É uma questão de educação] e não só, é uma escolha. Podes escolher marcar a diferença pela positiva. E aquele senhor, um querido, no final disse: próximo domingo estou cá e se vocês não vierem têm falta de comparência”, salientou.

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