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A Entrevista – Filipe Salgueiro

A Televisão
17 min leitura

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Começou como Moranguito, em 2005, mas hoje está noutro patamar. Cresceu e desenhou um caminho profissional irrepreensível, sem nunca baixar os braços. Das passerelles para os palcos, o ator e por agora encenador tem no teatro um amor maior e diz que é nele que encontra a sua verdadeira essência. «Por vezes a dedicação incomoda quem vive na inércia. Gosto demais do que faço e acho que isso transparece», revela Filipe Salgueiro, que se prepara para estrear A Sala de Espera, um original de sua autoria. A peça de teatro conta com uma novidade nesta área: Lúcia Garcia.

Estreaste-te em televisão na série Morangos com Açúcar, na TVI. Sei que não querias fazer o casting, a tua agente é que insistiu. Hoje em dia consideras ter tomado uma boa decisão?

Sim, foi um dos projetos mais importantes da minha carreira, foi uma escola. Faz de mim o ator que sou hoje. Quando recebi o convite dos Morangos fiquei exitante. Mas claramente fui presenteado com um desafio, uma personagem fantástica.

Achas que a série deu-te uma «armadura» gigante para o ator que és hoje?

A série deu-me o início de um longo percurso. Mas acho que um ator e a sua formação é no palco. O teatro é o meu grande amor. São aquelas tábuas que te ensinam e te dão essa «armadura» que falas. Um verdadeiro ator de teatro faz televisão sem pestanejar. O teatro é a verdadeira essência do ator.

Entraste na segunda temporada. Já tinhas noção do fenómeno?

Confesso que não. Foi toda uma aprendizagem lidar com situações complicadas, como entrar no cinema às escuras e não poder ir ao supermercado. [risos]

Como descreves a tua passagem pelos Morangos?

Perturbante, mas muito real. Levantou questões muito importantes, nomeadamente a nível dos distúrbios de personalidade dos jovens e, claro, a nível do bullying e da violência doméstica.

E como foi interpretar o Luís Alvarenga, um rapaz violento que batia em mulheres?

Havia dias que saía de estúdio muito tenso e com dores musculares. Era uma tensão muito grande. A produção queria que eu fosse mesmo mauzão! [risos] Mexia comigo. Mas tudo se supera e fico feliz, como ainda ontem um rapaz me veio dar os parabens pois está a recordar a personagem no Panda Biggs.

A própria construção da personagem era muito boa. Fugia à típica personagem dos Morangos com Açúcar.

Sim, era completamente diferente. Acho que foi isso que me estimulou: gravar em Londres como bom da fita e depois transformar-me num monstro quando venho para Portugal.

Que recordações guardas das gravações em Londres?

Fenomenais. A equipa era top e em alguns locais só tinhamos autorização para gravar alguns minutos. As ruas paravam e tinha de sair tudo à primeira. Foi realmente estimulante.

Os Morangos tiveram muita importância no panorama artístico televisivo, e a tua temporada lançou grandes nomes. Defendes o regresso da série?

Acho que talvez tenha sido o seriado mais importante da história televisiva portuguesa. E sim, a minha série é defendida como a melhor e mais completa. Acho que talvez juntarem Morangos de várias séries tipo versão all stars e alguns já com filhos na série seria interessante. Mas os argumentos têm de ser bem ponderados e devem arriscar mais.

Tens fãs que te acompanham desde o início da tua carreira?

Sim, tenho pessoas que seguem o meu trabalho desde essa altura. Muitos deles acabam por ser amigos e que vão aos meus espetáculos. São muito queridos, oferecem-me presentes e têm sempre uma palavra amiga; têm páginas na internet e grupos de fãs que se organizam. Fico muito lisonjeado que gostem do meu trabalho.

A que se deve a tua ausência da televisão? Foi uma opção tua?

Eu, paralelamente à televisão e dos restantes projetos televisivos que fiz, fiz outras coisas. Estive fora de Portugal, fiz cinema, fiz muita moda, fiz muito teatro. Acho que o «bichinho» de voltar a fazer televisão está a voltar e quem sabe se não acontece. A verdade é que olho para trás e já fiz tantos projetos que me orgulho e penso como me irei surpreender mais desde aquele dia que fui abordado pelo Tó Romano na rua…

Foi nesse dia que tudo mudou. Ao longo da tua carreira de ator e de manequim, tens vindo a representar diversos papéis. O que sentes de diferente em cada área, nomeadamente no que diz respeito à reação do público e à interpretação das personagens?

Não faço distinção entre comercial e alternativo. Tenho uma visão mais alargada, daí ter público de várias áreas que seguem o meu percurso. Acho que cada vez mais as áreas se fundem. Assim como vemos modelos serem atores, vemos atores a darem cara por campanhas como modelos. Cada projeto para mim faço uma avaliação individual e o que me trás de desafiante, de estímulo… Daí ter feito tanta coisa diferente e ter mudado tantas vezes de imagem, que é extremamente importante quer para um ator quer para um modelo.

Qual o projeto a nível de representação que mais te agradou?

A nível de representação, filmar Emily com Peter Webber. E claro, o filme que estou a fazer neste momento, que não posso adiantar detalhes, mas em breve saberão.

E como modelo, qual o projeto mais desafiante?

Trabalhar com o Miss J do concurso American Next Top Model, desfilar em Paris, fotografar com Jeff Maranno para o livro Eros… Tantos momentos.

Ator de teatro, de televisão, modelo… Pode-se dizer que tens um currículo invejável quando comparado com a maior parte dos atores em Portugal.

É o meu. Invejável ou não, não sei. Mas de certo muitos colegas meus terão também projetos bem interessantes para partilhar.

Batalhaste muito para chegares até aqui?

Sim, batalho sempre. Quem me conhece sabe que sou muito batalhador. Não sou obcecado, isso é uma ideia nos dias de hoje que se confunde com ser persistente e dedicado. Eu tenho e faço o que quero porque sou trabalhador, de outra forma não saberia fazê-lo.

Quais são as tuas maiores fragilidades enquanto ator?

Talvez fazer de mim próprio em palco.

E quais achas que são os teus pontos fortes?

Se não sei fazer, aprendo.

Como qualquer ator, certamente já passaste pela chamada «travessia do deserto». Como lidas com as fases menos positivas?

Muitas das vezes são as melhores alturas de criatividade. Eu tenho um defeito: a vida ensinou-me a ver tudo pelo lado positivo. Nem que seja 10% e serão nesses que vou acreditar e investir. Arregaço as mangas e vamos lá!

És persistente? Tentas nunca cair na tentação de baixar as armas?

Eu não uso armas, mas não sei baixar os braços, o que por vezes é mal interpretado. Por vezes a dedicação incomoda quem vive na inércia. Gosto demais do que faço e acho que isso transparece.

Tens agora uma nova peça de teatro, uma comédia romântica. O que é que nos podes adiantar sobre A Sala de Espera?

É uma comédia romântica passada nos anos 90, mas com muitos walkmans, a geração dos «porquês», do yô-yô… Sem Playstation, mas com Game Boys. Sem Gigabytes, mas com disquetes quadradas às cores e as televisões também, a cores e bem quadradas. Sem redes sociais e a única coisa que vibrava no teu bolso era o Tamagochi. Nas aulas de educação física bombavas os teus ténis Pump, cabelos à tigela, vibravas com «Let the Beat Control Your Body». Não existiam likes mas tinhas milhares de tazos. O teu super herói era o Exterminador Implacável e as fotos vinham em rolos…

Bons tempos…

É esta a época que fez de ti quem és. Conta acima de tudo a história de duas pessoas que se amam e nenhuma se chega à frente e dá o primeiro passo. Todos nós conhecemos amigos assim. É uma comédia frenética!

Escolheste a Lúcia Garcia para se estrear em teatro, nesta tua terceira produção. O que é que sentiste que a Lúcia tinha para te acompanhar nesta aventura?

A Lúcia é a minha Penélope Cruz. Já nos conhecemos há muitos anos, temos uma excelente química. A Lúcia será a Bianca das Neves, uma jovem rapariga com humor genuíno que trabalha na caixa de um hipermercado. Acima de tudo, a Lúcia e o restante elenco é muito pouco convencional. Assim como numa sala de espera, encontramos pessoas distintas e diferentes.

E o teu personagem, o Bruno, um jovem que trabalha como segurança num centro comercial?

O Bruno é o porreiro lá do bairro dele. É um pouco ingénuo, mas muito amigo dos seus amigos e muito protetor e pronto sempre a ajudar. Apaixonado desde criança por Bianca, mas secretamente, pois são amigos desde sempre. O Bruno é um príncipe sem cavalo branco e armadura.

Como é que têm corrido os ensaios?

Muito cansativos, mas com uma grande energia. Não existem atualmente comédias com elencos tão grandes. É um grande desafio.

O que podemos esperar a nível de argumento, personagens e guarda-roupa no que diz respeito a esta peça?

Imaginem irem ao médico e, enquanto esperam na sala de espera, conheceram milhares de personagens e acontecerem coisas como que ali fosse o centro do mundo… Familiar? As pessoas vão associar a momentos da sua vida e pessoas que conhecem, sem falar de que os anos 90 têm pérolas culturais. Em termos de figurinos é quase como entrar na cápsula do tempo até aos anos 90 e o cenário é brilhantemente assinado pela pintora Helena Pedro Nunes que dispensa apresentação. Tudo foi concebido com muito amor e dedicação.

Já disseste que esta é a produção mais ambiciosa de todas as que fizeste até agora (Ménage e Amantes de Fresco). É a mais ambiciosa em que aspeto?

É a mais ambiciosa em todos os aspetos. Arrisco a nível de argumento pelas temáticas, arrisco na comunicação… Convidei um amigo e um talentoso ilustrador para me ajudar a conceber as imagens que são ilustrações assinadas por João Rodrigues, todas únicas e tão especiais. Tudo é um arriscar, mas sempre com um intuito: fazer rir o espetador, sempre de forma inteligente e descomplexada.

Estas peças surgem na tua cabeça em que altura? São histórias que tens guardadas na gaveta e depois vais buscar?

Eu acho que estou numa fase que é constante as ideias de argumentos. Sempre escrevi e muitas das coisas, sim, vou guardando e anotando. E de repente as personagens que começam a ter vida própria contam-me a sua história e quando me apercebo já está escrito. Tenho sempre muitos projetos. Não tenho é aquela sede de rapidez que hoje em dia temos para chegar depressa ao objetivo. Nessa pressa perdemos o sabor da viagem.

Como é estar do outro lado do guião? É aí que te queres manter num futuro próximo?

É diferente e muito desafiante. Adoro todo o processo de ser ator e todos os argumentos que escrevo são escritos do ponto de vista do ator. Talvez por isso todas as personagens são estimulantes e importantes. Não preciso de definição. Vejo-me debaixo de uma palmeira a apanhar sol e ir dar um mergulho, mas também não será para sempre… Sou ator acima de tudo, agora sei bem que é isso que sou, mesmo que estivesse a tirar bicas oito horas por dia.

A comunicação social está atenta ao teu trabalho?

Se algo me assusta talvez seja por aí. Pela pressão que estou a sentir. Por me falarem de carreira, por tantos acreditarem em mim e o público gostar de seguir o meu trabalho. Sei que sou esforçado, sei que quem erra é sempre quem faz. Não tenho receio do erro, tenho receio da desilusão. Mas mais por querer ouvir os risos do público. Alimento-me de aplausos. Fico feliz de estarem expectantes e nunca me passou pela cabeça ser uma referência.

Sentes que o povo português é realmente amante do teatro?

Sim. E acho que o teatro também se deve reciclar e cativar o público. Mas não só o teatro! Ora reparem no sucesso do Pátio das Cantigas. Acho que as pessoas do meio muitas delas têm uma noção demasiadamente elitista e erudita, que compreendo… Mas para mim, assim como um pasteleiro fabrica bolos para serem comidos, quem faz teatro pretende que o público venha ver. E eu que adoro bolas de Berlim com creme é assim que vejo que as coisas devem ser feitas. Mas também aceito que haja pessoas que preferem bagas de goji.

E como avalias o atual panorama televisivo português?

Acho que iremos testemunhar algumas reviravoltas. Acho que o público está cada vez mais exigente e reparo que os elencos finalmente estão a ter verdadeiros bons atores, atores diferentes, os argumentos também mais diferentes. Era interessante investirem em formatos novos e séries com temáticas engraçadas. Faz falta uma série de comédia na televisão, por exemplo.

Fazendo referência à tua peça de teatro, a minha última pergunta é… Quem espera, desespera ou quem espera sempre alcança?

Como na vida, esta peça é exactamente essa dualidade de sentimentos dessas expressões. Esse é o maior subtexto desta peça, mas só saberás o seu desfecho se efetivamente esperares. E hoje em dia ninguém espera por nada nem ninguém… Ou espera?!

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