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Maria João Vaz viveu 50 anos com “um segredo”: “Levei uma vida paralela em que eu era a Maria João”

"Nasci com um cérebro feminino e a minha genitália veio de outro lado."

Ana Ramos
4 min leitura
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Maria João Vaz foi uma das convidadas de Manuel Luís Goucha, esta terça-feira, e falou sobre o seu processo de autodescoberta ao longo dos anos.

A atriz começou por explicar que se sentia “sempre à parte” quando era mais pequena e, quando tinha cerca de seis anos, fez um papel numa peça de teatro com um amigo em que se disfarçou com roupas da sua mãe, pela primeira vez: “Houve qualquer coisa ali, uma epifaniazinha”.

“Não sei qual foi a reação das pessoas. Aquilo foi para a família, para os irmãos, para os pais. Não sei se acharam graça porque, logo a seguir, eu comecei a fazer aquilo em segredo”, contou Maria João Vaz, referindo que costumava vestir roupas de mulheres.

“Vestia-me quando estava sozinha em casa, fechava-me na casa de banho. Era tudo muito triste, era tudo muito penoso. Eu sentia-me muito bem, mas ficava a olhar, depois, assim: ‘E agora o que é que eu faço a seguir?’. Não percebia porquê que eu fazia aquilo, renegava e, depois, voltava a fazer”, descreveu Maria João Vaz.

“Levei uma vida paralela em que eu era a Maria João e um percurso oficial perante a família, perante as pessoas, a sociedade como outra coisa”, afirmou Maria João Vaz, indicando que chegou a casar e a ter três filhas.

Durante esse período, a atriz “tentava interpretar o que é que se passava ali” quando se olhava ao espelho.

“O meu pai e o meu irmão mais velho eram muito machistas e, portanto, não era permitido uma pessoa ter assim a minha sensibilidade. Eu era uma pessoa diferente, uma pessoa que se isolava, que não falava com as outras pessoas. Tinha o meu mundo”, recordou Maria João Vaz, referindo que, na escola, não a percebiam e eram tratavam-na mal, sendo protegida pelo seu irmão.

Maria João Vaz define-se como uma “mulher trans binária” e identifica-se como “uma mulher cis”: “Uma mulher que nasce tem uma determinada genitália e o seu género está de acordo com essa genitália. A pessoa sente-se bem como nasceu”. “A minha perceção, como por exemplo, eu tenho os olhos verdes porque a minha mãe tem olhos verdes… há essa partilha de cromossomas. Eu tenho a convicção absoluta que o meu cérebro é um cérebro feminino. Nasci com um cérebro feminino e a minha genitália veio de outro lado. Há uma incongruência”, afirmou Maria João Vaz.

“Para mim, desde pequena que a minha antiga genitália me causava disforia, era uma coisa que eu reprimia. Eu não queria aquilo. Nos simples desejos de dia de anos ou de véspera de Ano Novo, eu só queria acordar no dia seguinte sem aquilo”, continuou Maria João Vaz, referindo que gosta “de pessoas”, independentemente do “género ou genitália”.

Maria João Vaz falou ainda sobre o preconceito que existe e acrescentou que, mesmo que um homem se apaixone por uma mulher trans, “muitas vezes, é sempre remetido para o segredo, não querem assumir aquilo em público, não têm coragem”: “Reprimem eles próprios perante a família, perante os amigos, porque, se fizessem isso, poderia haver alguma dúvida grave – ‘Espera lá, se eu gosto de uma mulher trans, essa mulher trans iniciou o seu percurso como homem e, portanto, quer dizer que eu gosto dela, eu gosto de homens, eu sou gay’”.

Veja aqui e aqui uma parte da conversa.

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