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De visita a Portugal, Leonardo Miggiorin confessa: “Adoraria fazer televisão por aqui”

André Vilar
22 min leitura

Estudou e exerceu psicologia, é ator de cinema, de teatro e de televisão. Já foi músico e até esteve perto de ganhar um concurso televisivo… de dança. Leonardo Miggiorin é um ‘homem das sete artes’ e está de visita a Portugal. Local onde, aliás, adoraria trabalhar.

A Televisão – Poucos o sabem mas, antes de ser ator, o Leonardo fez formação em Psicologia e chegou mesmo a exercer na área. A Psicologia sempre foi um sonho?
Sim, desde os 12 anos que eu queria ser psicólogo. Uma prima minha se formou em psicologia quando eu tinha 12 anos e eu achei interessante. É uma palavra tão bonita que eu pensei: “Acho que tem alguma coisa ali para mim”. Eu sabia que seria um conhecimento, um estudo sobre as emoções, sobre o ser humano, sobre as relações…e eu já tinha uma conexão muito forte com esse conteúdo.

E as artes surgem depois?
Nessa mesma época eu comecei muito cedo tocando teclado, violão e comecei a pintar. Tenho uma tia cantora, uma tia pintora e uma tia pianista. Eu sempre tive muita influência delas. Então aos 12 anos comecei a fazer teatro. Começou tudo de forma natural, como uma brincadeira mesmo. De repente fui para uma escola profissionalizante e a minha carreira artística começou a ser uma possibilidade. Eu ganhei um prémio na escola, depois fiz um comercial e fiquei conhecido na escola e na cidade. Eu fui caminhando passo-a-passo até chegar aos 19 anos num trabalho de muita projeção que foi o A Presença de Anita de Manoel Carlos. Eu acabo sendo reconhecido em muitos lugares por conta não só deste projeto como de diversas telenovelas que eu participei. Sou muito grato por isso e muito realizado na minha profissão.

“Acho que estamos todos no meio de um caminho: você vem de algum lugar e está indo para algum lugar”

E conseguiu conciliar a Psicologia e as Artes?
Quando fiz 18 anos comecei a estudar Psicologia porque eu queria fazer uma faculdade. Pude ter um conhecimento mais racional. O meu aprendizado no mundo do teatro não foi teórico, foi prático. A psicologia entrou como um complemento que me deu muita base para tudo. Cheguei a trabalhar como psicólogo durante dois anos, numa clínica em São Paulo. Mas comecei a sentir muita falta dos meus personagens, da plateia. E vi a Psicologia como estando ao serviço da arte. Eu procuro entender o contexto histórico das personagens. De onde elas vêm, quais as suas emoções, como elas recebem e como reagem às situações. Porque somos seres complexos. Nós somos atravessados por muitas dimensões. Somos de carne e osso mas também espírito e emoção. Ao mesmo tempo que estamos dentro de nós,estamos fora também. Em geral acho que estamos todos no meio de um caminho: você vem de algum lugar e está indo para algum lugar. Assim como eu. E a gente se encontra no meio desse caminho. E o que acontece é uma química entre os indivíduos e as coisas se desdobram a partir daí.

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No universo da representação o Leonardo já fez um pouco de tudo: televisão, teatro e cinema. Tem preferência por alguma destas áreas?
Eu gosto de variar. Se faço algum tempo televisão tenho vontade de fazer teatro, ou vice-versa. Eu moro no teatro. Eu vivo no teatro. O teatro é a minha casa. É onde eu pesquiso, é onde eu posso ter mais autonomia. O teatro me dá autonomia. Eu posso escrever um texto, montar uma peça e apresentar. A televisão e o cinema já não me dão essa autonomia. Eu dependo de equipas, dependo de uma estrutura gigante. Mas eu sou apaixonado pela televisão. Não teria problemas em dizer que o que mais quero fazer agora é televisão. No entanto não dá para eu decidir por uma coisa só.

Ainda muito novo participou em Malhação onde, muito provavelmente, acabou por se dar a conhecer ao público português. Este projeto foi um ponto de viragem na sua carreira?
Eu fiz Malhação mas penso que os papeis que me deram mais destaque foram em Senhora do Destino e A Presença de Anita. O personagem que mais transformou a minha vida foi o Zézinho de A Presença de Anita. Recentemente fiz uma novela, que também passou em Portugal, chamada Terra Prometida, que ganhou muita audiência. Então muita gente me conhece por causa dessa personagem chamada Otniel. Na verdade cada um lembra de uma coisa e eu penso: “bom, pode-me chamar do nome que quiser que eu vou gostar”. Em geral a abordagem é muito carinhosa.

“O que é visto pelo público é a ponta de um icebergue. O que está por baixo é a vida do artista. E essa vida tem que ser boa, tem que valer a pena, tem que fazer sentido.”

O projeto mais recente em que participou foi para a Record na novela Jezabel, certo? Como foi dar vida ao escravo Isaac?
Isso! Que acabou de estrear aqui. Foi maravilhoso. Gravámos em Marrocos e foi uma experiência espiritual até, eu diria. Trouxe-me muita cultura, muito conhecimento, muita alegria também. Eu sou muito grato, sou muito feliz. Fiz muitos amigos que espero levar para a vida toda. Foi muito intenso. Em quatro ou cinco meses a gente gravou uma novela inteira. É um tempo curto. Mas acho que também por conta da idade, por conta das coisas que eu já passei, estou mais tranquilo. Sempre tive muito medo. Eu sempre fui muito introvertido. Eu sou de certa maneira tímido. Eu acabei desenvolvendo a extroversão porque o meu trabalho me levou a isso. Eu tenho sempre um pouco de receio do que vão pensar, do que vão dizer e, às vezes, me podava muito. Então hoje eu penso que sou um pouco mais tranquilo, e consigo fazer amizades mais sólidas e consigo me divertir mais, curtir o meu trabalho. Continuo a me focar na questão profissional mas hoje a ideia da convivência com as pessoas faz tanto sentido quanto o resultado né? Na verdade uma coisa está atrelada à outra. Se o processo é bom o resultado é bom. Se o processo é ruím você pode até ter um resultado bom para quem vê de fora mas para o artista em si não é tão bom. O que é visto pelo público é a ponta de um icebergue. O que está por baixo é a vida do artista. E essa vida tem que ser boa, tem que valer a pena, tem que fazer sentido. Então hoje eu priorizo as relações, a boa conduta…Isso foi sempre assim mas como eu era um pouco retraído, tímido e nervoso eu talvez tenha perdido a chance de relaxar um pouco mais e me divertir fazendo o que mais amo que é a arte.

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Para além da psicologia e da representação a música também fez parte da sua carreira. É uma área que ficou para trás ou que ainda tem um lugar na sua vida?
Eu fiz parte de uma banda, era um hobbie. Eu adoro escrever e então compunha as letras e também cantava. A gente apresentou na Xuxa e no Jô Soares. Mas de facto a carreira como ator me puxou. Eu faço musicais, adoro fazer musicais. Estudo canto e sempre na tentativa de poder ter mais habilidades. Ser um artista mais completo. Mas a música como profissão só a nível do teatro musical. Eu li uma frase muito boa numa ruela de Lisboa que dizia que o estúdio do artista é o mundo. Na verdade todas as formas de arte são bem-vindas para mim. Todo o tipo de conhecimento vai agregar minha carreira.
E não me fecho para nada. Agora procuro ter um foco na minha carreira como ator. E também pretendo um dia me tornar um diretor. Estudar para isso. Quem sabe aqui na Europa, estudar direção.

“Sei que já temos muitos brasileiros aqui mas eu adoraria fazer televisão por aqui.”

Vir trabalhar para Portugal é uma possibilidade então?
É um sonho grande que está-se tornando mesmo um sonho. Sei que já temos muitos brasileiros aqui mas eu adoraria fazer televisão por aqui. De maneira nenhuma penso deixar o meu país. Eu quero é poder viajar, poder ter o meu trabalho reconhecido por outras nações, por assim dizer… Não deixo as minhas raízes de lado. Eu continuo a gostar das coisas que gostava e ainda mais.

Falemos agora da experiência no Dancing Brasil. Foi concorrente e ficou em terceiro lugar. Como foi participar neste programa?
Ai, quase ganhei. Quase ganhei. Eu gosto muito de dançar e foi um período muito intenso de trabalho. Um enorme nervosismo dançar ao vivo, algo que não estou habituado. Gosto muito de dançar. Ali era um formato totalmente novo para mim. E sim, fiquei muito contente em participar. Não ganhei o prémio final mas ganhei a plateia. Até hoje sou reconhecido pelo Dancing Brasil e muita gente fala comigo com muito carinho a partir disso.

As artes estão-lhe mesmo no sangue Leonardo…
Olha eu tentei fugir disso. Eu fui trabalhar com a psicologia. Tentei parar para ver se era isso mesmo que eu queria. E sim, é isso mesmo que eu quero.

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O Leonardo é, sem dúvida, aquilo que em Portugal chamaríamos “o homem dos sete ofícios”. Falta fazer alguma coisa no mundo do espetáculo?
Eu sou ator e quero continuar a ser ator para o resto da minha vida. Trabalhar com personagens. É o que mais me atrai: criar personagens e contar histórias às pessoas. As causas que eu apoio elas vêm através da minha arte mesmo. Espero com mais maturidade, daqui para a frente, poder desenvolver um trabalho autoral. Um trabalho que eu possa escrever alguma coisa, que eu possa dizer algo. Não apenas participar de projetos que me convidam (aos quais sou muito grato e quero continuar) mas também quero desenvolver alguma coisa minha. Gerar debate, conteúdo. Eu sou um homem de relações duradouras. E eu espero que seja assim para o público. Assim o espero.

“Eu acho que todas as classes que lutam por algo lutam pela mesma coisa. As mulheres, os negros, os gays, os índios, lutam por direitos de igualdade, de liberdade de expressão, de liberdade para ser quem querem ser, no mesmo convívio.”

E por falar em convites: como foi receber a proposta para ser embaixador do Festival da Canção Infantil dos Países de Língua Portuguesa?
Olha, foi através de um amigo produtor de teatro e da esposa, Maria Jesus Vitorino. A Maria me convidou para ser embaixador desse festival que vai acontecer em maio de 2020. O embaixador é aquele que vai falar do projeto e tentar agregar o máximo de pessoas. Acho que é um festival muito bonito e importante porque ele reúne todos os países de língua portuguesa e crianças. Eu penso que temos de investir nas novas gerações. Há um filósofo francês que fala nessa ideia da humanidade mesmo. Ensinar as pessoas a viver, a se relacionar. Eu acho que a gente vive hoje uma crise global. Diversas crises: a crise na educação, a crise territorial, a crise financeira, económica, ambiental… Mas essas crises todas partem de uma crise da humanidade. Parte de um princípio que é enxergar o próximo como semelhante mesmo, e não como alguém distinto, que não merece as mesmas coisas, os mesmos direitos. Eu acho que todas as classes que lutam por algo lutam pela mesma coisa. As mulheres, os negros, os gays, os índios, lutam por direitos de igualdade, de liberdade de expressão, de liberdade para ser quem querem ser, no mesmo convívio. Se há respeito pelo ser humano você pode ter as suas próprias características, a sua própria identidade e é interessante que não se perca isso. Um festival como este vem reunir as pessoas de diversas etnias, com um elo em comum que é a língua, mas que promove também um encontro. Estou aqui muito feliz com esse convite e foi uma grande coincidência. Eu vim para Portugal para acompanhar os meus pais no passeio. Na verdade eu vim para divulgar o festival mas, a princípio, a primeira coisa que eu vim fazer foi passear com os meus pais. E automaticamente a novela estreou na mesma data em que estou aqui, isso foi uma coincidência. Eu também estou no ar com uma outra novela chamada
Essas Mulheres, também da Record, e aí estou participando de muitos projetos, muitos programas de TV,entrevistas, e estou muito feliz com isso. Inclusive da receptividade do público português que tem me reconhecido bastante nas ruas e me tratam sempre de uma forma muito carinhosa.

As pessoas abordam-no aqui em Portugal? O que é que dizem?
Todos os Ubers que eu peguei, por exemplo, eles ficam olhando do retrovisor e numa hora não aguentavam e diziam: “és um ator português?”. Eu dizia que era um ator brasileiro e aí sim, começávamos a falar. Falam dos meus personagens. Estou muito feliz, muito contente por isso.

É a primeira vez que visita o nosso país?
É a terceira vez que estou em Portugal mas nunca explorei esse mercado artístico. Nunca explorei como uma possibilidade como agora.

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O que é que mais gosta no nosso país?
O que mais gosto aqui… são as pessoas. As pessoas. A forma como cuidam da própria cultura e das próprias coisas. Como vocês cuidam dos monumentos, como a comida é feita, como é servida, como as pessoas são recebidas. Claro, estamos num momento de turismo, de muita emigração, então há uma certa confusão porque há muita gente na cidade. Mas penso que é um exemplo para o mundo todo. Agora não posso deixar de falar da comida e das paisagens. Das boas coisas da vida que aqui tem. E pude conhecer um bar ou outro e vejo que Lisboa tem-se desenvolvido muito na “night life”, na noite.
Isso está cada vez melhor também. É um lugar para qualquer tipo de interesse. Aqui se encontra de tudo.

“Ele (Filipe La Féria) é um produtor que tem um grande respeito pela arte, é muito respeitado aqui, e eu gostaria de bater um papo com ele”

Já teve oportunidade de conhecer o que se faz por cá ao nível das artes?
Fui ao teatro assistir Mário no São Jorge. Gostei muito da peça que eu vi. O actor muito bom, a plateia me encantou muito porque eram muito respeitosos, muito silenciosos e aplaudiram de pé muito calorosamente. Agora quero assistir As Troianas que estão nas ruínas (Ruínas do Carmo), e quero assistir Severa de Filipe La Féria. Ele é um produtor que tem um grande respeito pela arte, é muito respeitado aqui, e eu gostaria de bater um papo com ele. Receber talvez uma orientação dele. Às vezes o que a gente precisa é só de uma orientação. Por isso o estudo é muito importante. Por isso este festival é muito importante. Porque se pode orientar as crianças. E isso é muito legal. É muito fixe, como se diz aqui.

O que é que já conheceu da televisão portuguesa?
Fui na SIC, no Programa da Cristina. Vou também no Alô Portugal e fui até à Record Internacional. Estou surpreso com o que tenho visto.

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Vai estar em Portugal até quando?
Vou para Espanha terça-feira. Estou viajando há seis meses. Eu tirei um tempo para viajar e respirar um pouco. Ganhar novos horizontes, novas culturas. Pensar um pouco que caminho quero fazer daqui para a frente. Não que seja uma crise de identidade ou de trabalho. Sei bem o que quero de trabalho mas eu penso assim: “O que quero dizer agora? Que tipo de arte quero fazer?”. Agora estou indo para Espanha e volto para o aniversário do meu sobrinho no dia 30, no Brasil.

“Faço votos que eu mesmo possa ser mais um a contribuir com essa ponte Brasil-Portugal”

Há pouco falávamos sobre um intercâmbio de atores: há cada vez mais profissionais portugueses a trabalhar no Brasil, e cada vez mais atores brasileiros a ingressar no mundo da representação em Portugal. Conhece os atores Paulo Rocha, Ricardo Pereira e Pedro Carvalho?
Sim, conheço o Ricardo Pereira. Gosto dele como pessoa e como profissional. Uma pessoa extraordinária, de uma cultura, de uma educação, um homem íntegro, e sua esposa com uma postura muito bonita. Merece aplausos mesmo. Os outros atores não conheço mas admiro muito. O Pedro está muito bem também e espero que cresça cada vez mais e que essa ponte, essa conexão Brasil-Portugal, possa se desenvolver mais. A arte trata da identidade um povo. Somos primos distantes, mas não tão distantes. Temos muito em comum, muito a agregar. Os brasileiros são um povo maravilhoso, um povo acolhedor, um povo que precisa de contacto com outras culturas. Faço votos que eu mesmo possa ser mais um a contribuir com essa ponte Brasil-Portugal e sim, não vou negar, tenho muita muita muita vontade de trabalhar aqui e conhecer melhor o ambiente artístico de Portugal.