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A Entrevista – Luís Rodrigues

A Televisão
14 min leitura

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The Social Girl é a nova curta-metragem da Plateau 31, assinada por Luís Rodrigues e que conta nos principais papéis com a atriz Liliana Santos e o ator Pedro Barroso. A história explora os diferentes conceitos das relações pessoais e visa desafiar o grande público a uma curiosa introspeção. Luís Rodrigues quis perceber até que ponto é que estamos tão distantes do que nos é oferecido virtualmente. «Isto é uma sátira à comunicação que temos vindo a perder. É um grito contra a distância pessoal, contra a frieza na troca e partilha entre pessoas». E agora desvendamos um pouco mais sobre o enredo…

3 A Entrevista - Luís Rodrigues

Com apenas 19 anos «confecionaste» uma produtora de cinema independente, a Plateau 31. Lutaste muito para levar o teu navio a bom porto?

Este navio ainda agora entrou em alto mar. Digamos que não lutei pela criação desta entidade mas sim pelos projetos que a constituem. É certo que ainda sou jovem (e que os erros é que me tornam mais profissional) mas a verdade é que os projetos que hoje apresento estão inseridos numa parada mais alta do que alguma vez imaginei. Isso é bom. Obriga-me a crescer e a dar melhor resposta. Entrego-me de corpo e arte a tudo o que assino; projeto constantemente novas ideias; e sem qualquer apoio financeiro, tento otimizar recursos logísticos e de pessoal para podermos fazer mais e melhor. Nem sempre é fácil (quase nunca é), mas tenho tido as pessoas certas.

Qual a importância da sétima arte na tua vida?

Esse grande conceito de cinema para mim ainda é uma estrada de aprendizagem. Não sou ainda o que quero ser. O que faço é dedicar-me a personagens. Desde sempre classifico-me um pequeno autor que gosta de pessoas, de criar histórias e de produzir diálogos. Para mim, poder trabalhar em cinema é exatamente isso: poder construir vidas, apaixonar-me pelo que estas personagens podem fazer e dizer, e de certa forma entregar-lhes os meus toques pessoais e lunáticos. Ter o luxo de movimentar diferentes «eus» é o que me leva a dedicar-me a fazer filmes.

Trabalhas normalmente em argumentos originais. Quando é que se sente que uma determinada ideia pode resultar em algo?

É uma pergunta interessante. O que posso dizer é que escrevo muitos guiões, mas só alguns é que levo para a frente. Outros ficam pelo caminho. Não depende só das ideias mas sobretudo do perfil de quem as vai produzir. Há histórias que não me largam e que as visualizo na minha cabeça, outras que estavam destinadas a amadurecer durante mais tempo…

A tua última curta-metragem, The Social Girl, é sustentada por duas personagens de origens muito diferentes, o que implica na construção de backgrounds muito distintos.

O argumento foi desenvolvido sobre uma grande decisão: construir duas personagens que se reinventassem várias vezes, ao longo de toda a história. Este foi o grande ponto de partida. O criar diferentes registos num mesmo conceito de personagem. Foi isso que trouxemos ao público. Revelar que no final ambas tinham um mesmo objetivo comum só permitiu que oscilássemos no processo de construção destas Bio’s ao longo de todo o drama. Este Jornalista [Pedro Barroso] e esta Social Girl [Liliana Santos] partilham sem dúvida um grande background: o do faz de conta. No final foi apenas inserir momentos provocantes ora de um, ora para outro, de modo que todo o tempo do filme se passasse num grande clímax.

Um jornalista e uma webcam girl em constante interação. Quem são realmente estas personagens?

Na realidade eles não são nada do que aparentam. Ela está longe de ser uma webcam girl e ele um repórter. Estas personagens representam a força de um relacionamento. Temos claramente um casal a viver uma fantasia sexual e a utilizar ferramentas criativas para contornar o quotidiano da relação. Na minha opinião, são duas pessoas apaixonadas, que se conhecem, que se respeitam, longe dos estereótipos da sociedade e que dominam um grande segredo: o alimentar uma vida a dois.

Porquê a Liliana Santos e o Pedro Barroso?

Em primeiro lugar são dois atores que sempre admirei. Foi a primeira vez que os conheci e que trabalhei com eles, e não podia estar mais satisfeito com o trabalho que produzimos. Quando ensaiámos juntos pela primeira vez, foi numa esplanada de uma praia (algures). A presença subtil que a Liliana assumiu naquele lugar, o tom quente que deu lugar às falas, a forma penetrante como o olhar dela consultava a reação do Pedro deu-me clara certeza que era a atriz indicada para este papel. O Pedro é um naturalista de raiz em tudo o que faz. As indicações importam-lhe até ao momento em que ele já é a personagem.

E frente-a-frente…

E frente-a-frente, o homem e a mulher, tornaram-se a combinação perfeita. Eles respondiam-se mutuamente com olhares. Isso resultou. O meu filme já estava a ser feito. O que é que influenciou na escolha da Liliana e do Pedro? Quando os convidei eu sabia que isto que contei ia acontecer.

Existe algum motivo em especial pela abordagem deste tema (o sexo virtual)?

Eu tenho uma imaginação fértil. Não. Nós estamos num mundo em que tudo o que procuramos está digitalizado. O curioso é que mesmo à distância existem situações tão físicas e tão próximas de nós. O efeito disso é esta curta (ou pelo menos o que ela sugere). Eu sou uma pessoa de redes sociais, a internet é uma ferramenta de trabalho bastante útil para mim. O conceito da mulher virtual está presente em cada janela das minhas acões. E a um passo de um clique, surgiu-me a Social Girl. A necessidade de filmar sobre isto foi a de perceber até que ponto é que estamos tão distantes do que nos é oferecido virtualmente.

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«The Social Girl» estreou em outubro no Teatro do Bairro (Bairro Alto)

«Passa-se tudo numa dimensão virtual. As pessoas não se relacionam pessoalmente», diz o jornalista no início da história. Qual é a mensagem que pretendes passar?

Isto é uma sátira discreta à comunicação que temos vindo a perder. Tenho ótimos amigos que falam tão bem pelo Facebook e que pessoalmente não conseguem alimentar um discurso. Isto é (tem de ser) inadmissível numa sociedade avançada como a nossa. Uma das funções do cinema é basear-se em nós. E esta personagem explora também isso. Sem dúvida que este é um grito contra a distância pessoal, contra a frieza na troca e partilha entre pessoas. Temos que ser mais humanos, mais quentes. Quando não há contacto, há traição. Há engano daquilo que chamamos relações.

Vejo que tiveste a preocupação de criar diálogos inteligentes.

Não podia ser de outra forma. Estas personagens tinham obrigatoriamente que ter uma voz própria e muito intensa do princípio ao fim. Era essencial que cada vez que falassem criassem ilusões, levassem o espetador a novas dimensões fora daquele quarto. Os exemplos que elas proporcionam são desafios para o público que só aumentam o ritmo do filme. Tínhamos que apostar nisto. Aqui os atores eram muito responsáveis pela forma como expunham o diálogo. Não bastava interpretá-lo, tínhamos que fazer o público sentir, o público tinha que estar lá.

A curta-metragem é destinada ao público em geral?

A curta destina-se apenas àqueles que tem disponibilidade de pensamento para ela. Não é apenas um filme sensual, não é vintage nem é sexo. É humano. É inteligente. Fala de relações. Aqui eu gosto de destacar os casais que precisam de ver estas histórias, que têm que aprender como acreditar novamente nas suas intimidades. Eles são os meus destinatários. Quem já domina o segredo, então usufrua da construção e do cenário da história. Temos duas grandes atuações… Assusta-me um pouco quando as pessoas ficam surpresas no fim, isso só significa que estão longe daquilo que precisam.

Qual foi o percurso do projeto até agora?

Desde a estreia no Teatro do Bairro que procuramos inserir a curta num circuito de festivais. Queremos levá-la a concursos e ao máximo número de plataformas, queremos mostrar a nível nacional e internacional este nosso trabalho. Acho que o devemos fazer com esta história. Para já estamos a traçar este caminho e a procurar ao mesmo tempo suportes e parceiros de forma a disponibilizarmos a curta para o público.

E como tem sido a reação do público?

As reações têm sido boas. As pessoas identificam-se com as personagens e ficam presas à história. De uma forma geral mostram-se todas surpresas com a reviravolta final. Todo o público que começa a ver o filme pensa ter descoberto o desfecho, e afinal…

Que achas do mercado audiovisual em Portugal? O que é que na tua opinião podia ser melhor?

O mercado audiovisual está diferente. Está num processo de transformação direcionado para os novos autores, para os novos realizadores. Eu neste momento consigo escrever, produzir e realizar (quase) sem ninguém. O olho português mudou porque também nós decidimos mudar. O mercado está mais recetivo, as distribuidoras estão a apostar cada vez mais em produto português. Isso dá-nos motivação para trabalhar, porque sabemos que as estruturas estão mais acessíveis. Há alguém que vai ver e avaliar o nosso trabalho. Existe hoje uma enorme possibilidade de o que fazemos poder estar acessível numa sala. Isto é uma bola de neve pois os atores olham para essas garantias, consequentemente as agências apoiam-nas. Eu acredito. Está a acontecer. Estamos a mudar. Só precisamos de mais e novos autores.

Que conselhos darias a um jovem que se queira lançar na realização de filmes?

Primeiro: para fazer mais do mesmo, sejamos assistentes. Segundo: se fosse fácil, toda a gente o fazia. Estamos num mercado em que temos que ser pró-ativos, produtores e distribuidores de nós próprios. Com ou sem apoios, o espírito do cinema terá de ser empreendedor. Esta foi a melhor escola que tive, a do mercado.

O que é mais difícil para ti nesta carreira de realizador emergente de cinema?

O grande desafio é afirmar-me na credibilidade enquanto realizador. Se quero ter uma boa equipa técnica e sobretudo um bom elenco tenho de dar provas de que mereço a confiança deles. Principalmente quando se trabalha com bons atores é necessário haver algo físico que demonstre o nosso trabalho e que apresente argumentos suficientes para que eles aceitam os desafios que lhes propomos. Esse foi sempre o meu objetivo, construir algo para que conheçam o meu trabalho e para que um dia possa ser reconhecido como um bom realizador (um dia…).

E o que é que é mais gratificante?

Ver ideias a ganharem formas. De um ponto de vista final, olhar para personagens que eu criei.

Perante tantas dificuldades a nível nacional no que toca ao cinema, pretendes continuar a fazer cinema em português ou tens em vista alargar horizontes para o plano internacional?

Pretendo continuar a escrever em português, a trabalhar com portugueses. A filmar nesta soalheira cidade. Temos tantos recantos por aqui, cada sala é um filme diferente. Olhar lá para fora (só pode ser) para divulgar o que de melhor temos.

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