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A Entrevista РJos̩ Gabriel Quaresma

Diana Casanova
9 min leitura

José Gabriel Quaresma é um dos nomes incontornáveis do jornalismo português, com particular destaque para o papel que desempenhou durante 15 anos no jornalismo desportivo. Contudo, ele recusa a ideia de que esta seja uma «especialização» sua, pois é «limitativo».

Com 24 anos de carreira, José Gabriel Quaresma já viveu muitas situações caricatas, desconfortáveis, momentos mais difíceis e outros mais fáceis. É sobre alguns desses momentos que falamos nesta conversa, com o objetivo de fazer um balanço da sua carreira na televisão portuguesa. Leia, em seguida, A Entrevista a José Gabriel Quaresma.


21 anos de TVI e mais alguns de carreira no jornalismo. Qual é o balanço que faz deste trajeto?

Após quase 22 anos na TVI e 24 (já completos) de jornalismo, o balanço só pode ser positivo, senão, não estaria a dar esta entrevista, tantos anos depois.

Terá certamente passado por vários momentos mais difíceis. Valeu a pena?

Valeram a pena, na exata medida que me ensinaram. Os erros ensinam, quem quer aprender, quem tem humildade suficiente para isso. Ainda ontem [24/11/2016] fiz várias horas de direto e, em um deles, um carro rebentou um pneu (com o barulho inerente) ao meu lado. Foi um susto, logo difícil, mas fez-se. Pior era no tempo das ameaças físicas e psicológicas, sobretudo no futebol, mas tudo foi aprendizagem.

Também já passou por algumas situações caricatas, como aquela em que lhe caiu um dente em direto enquanto fazia a cobertura de um ato eleitoral para a Presidência do Benfica. As pessoas ainda lhe continuam a falar desse momento?

Claro. Eu próprio mostro esse vídeo aos meus alunos sempre que início um curso. Quem trabalhar em televisão e não conseguir rir de si próprio, em primeiro lugar, não está preparado para trabalhar em tv. Sou o único jornalista em todo o mundo a quem tal aconteceu. Ser-se o único, no mundo, é sentir que somos uma espécie de Cristiano Ronaldo, não há mais nenhum. A diferença é que ele está no Guiness e eu ainda não. Ainda…

Já fiz brilhantes reportagens, excelentes diretos, mas foi a queda do pivot que me catapultou.

O que recorda daquela noite?

A minha aflição, naquela altura (tinha começado na TVI há pouco tempo), de me terem encontrado o pivot, no chão, de ter uma brutal receção na TVI, às duas e tal da manhã, por parte dos meus colegas, de ter ido a um dentista que se voluntariou para me arranjar o dente, pois viu tudo na tv, recordo tudo, naquela noite. Sou um tipo com sorte.

Foi uma escolha e vontade sua, ou foi obra das circunstâncias a sua incursão pelo jornalismo desportivo?

Foi um acaso. No fim do estágio na TVI estava aberta uma vaga no desporto, deram-me essa vaga e disseram-me: «se provares que mereces, ficas tu». Pelos vistos mereci. Naquela altura havia emprego, não havia exploração, não havia a anarquia que existe agora, por culpa de quem manda no jornalismo.

Estive 15 anos no desporto. Apresentei programas durante 14 anos. Saí, por opção, e dediquei-me à informação generalista, sou pivot, editor, fiz reportagens, grandes reportagens, e tudo o que é inerente à profissão.

Tratando-se de um tema que gera tantas paixões e emoções, alguma vez foi ameaçado ou teve alguma situação mais desconfortável por força do seu papel nos formatos desportivos que conduziu?

Nunca. A única vez que fui ameaçado foi há cerca de dois anos, já não estava no desporto há muito tempo. Os adeptos do futebol são cegos. Todos.

Houve alguns (tipo 300) que acharam que eu ia perder tempo com coisas da bola, e a propósito de um comentário, num post de um amigo (o meu comentário nada tinha a ver com futebol), eles acharam que eu lhes dava tamanha importância e ameaçaram-me, de morte, que me violavam, etc, etc.

Durou 24 horas, no Facebook.

Na vida real nunca tive qualquer problema durante todo este tempo todo, aliás, creio que os adeptos do futebol, de todos os quadrantes, gostam (avam) do meu trabalho.

Prefere fazer jornalismo desportivo ou mais «geral»? Porquê?

Jornalismo. Ponto. Jornalismo «mais geral» é menos limitativo.

Ao longo destas mais de duas décadas na TVI, foram muitos os diretores de informação com quem trabalhou, assim como várias as polémicas que chegaram à redação do canal (Ex Caso Ana Leal, Judite Sousa, etc). Como se lida com essas situações?

Não faço a mínima ideia. Eles chegam, passam e vão. Eu, continuo cá. Preocupo-me com a minha parte. Não me interessa rigorosamente nada as polémicas e os diretores. Observo, tenho opinião, mas nunca me aproximo. É lá com eles.

A redação costuma ficar «abalada» quando surge esse tipo de notícia na imprensa?

A redacção fica abalada com o dia-a-dia.

Já ponderou a possibilidade ou já foi contactado para mudar de canal? Se sim, pode dizer-nos qual?

Não e sim. Decidi, há cerca de um ano, que vou mudar de vida. Tenho preparado essa mudança. Quando chegar o momento mudarei. Até lá serei jornalista. Ao longo dos anos tive apenas um convite da SIC e um «convite», há dias, da TDM (Macau), que estive tentado a aceitar, apenas não aceitei por discordâncias de verbas. Quanto à SIC, foi há muitos anos, e José Eduardo Moniz não me deixou sair.

Pretendo abandonar o jornalismo, assim que consiga, e dedicar-me provavelmente à política local, ou à comunicação.

O jornalismo mata. A mim mata.

Falemos, então, de jornalismo. Como distinguiria o jornalismo que é praticado pelas três generalistas portuguesas?

Não há diferenças. Esse é um dos principais problemas.

E da TVI, acha que o jornalismo que fazia há 21 anos é o mesmo que faz hoje? O que mudou e como evoluiu o jornalismo da estação?

A evolução tecnológica. Ela veio mudar tudo. Acelerou tudo. O grande desafio, agora, é fazer muito rápido, com menos meios, e sem erros. O digital entrou nas redações tradicionais. O paradigma mudou.

Qual foi a importância da TVI24 nessa evolução?

É justamente na e com a TVI24 que (na TVI) essa mudança de paradigma começou. Fundimos duas redações e hoje o digital (online) está perfeitamente integrado na televisão.

Efetivamente o jornalismo continua a ser uma área de grande interesse para os jovens, mas o mercado de trabalho nem sempre os consegue «absorver». Que conselhos daria a quem pretende seguir jornalismo?

É ingrata, essa pergunta. O conselho é: sempre que uma porta se fecha abre-se uma janela, nunca desistir, até porque hoje, apesar de tudo, há mais plataformas onde se pode desenvolver algum trabalho. Nunca baixar os braços. Ter atitude pró-activa e profissional.

Para terminar, se pudesse eleger três referências do jornalismo português, quem escolheria?

Eu (estou a brincar), Carla Moita (TVI), José Alberto Carvalho e Clara de Sousa.

E o José, como gostaria de ser recordado quando se reformar?

Como um tipo de quem ninguém já se lembra.


Redatora e cronista