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A Entrevista – Clark

A Televisão
14 min leitura

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Os Clark editaram em 2013 o álbum «Bipolar», tendo apenas na altura distribuição digital, mas a banda assinou contrato de distribuição com a Farol Música, podendo agora o disco ser adquirido em formato físico, em qualquer loja do país. «Brilho Assassino», um dos temas deste projeto, está a ser sincronizado na novela Mulheres, emitida pela TVI. O A Televisão esteve à conversa com João Alexandre, vocalista da banda.

Como é que surgiu a banda Clark?

Os nossos primeiros acordes juntos aconteceram por volta de 1994, numa cave escura de um prédio na Urbanização da Portela, uma urbanização típica de classe média, local de fronteiras entre a urbana Lisboa e o subúrbio de Loures, onde quatro jovens, estudantes, com tempo livre, interesses e gostos musicais mais ou menos semelhantes se juntou com o objetivo de fazer música e a apresentar ao vivo. Sob o nome de Taxi Driver a banda realizou uma primeira maquete em 1995 no antigo Estúdio da Valentim de Carvalho com a produção de Paulo Abelho.

E como foi o vosso percurso até chegarem à Farol Música?

Em 1996 acabamos por assinar um contrato com a EMI depois de termos sido disputados por diversas editoras. Desse contrato resultou a gravação e edição do nosso primeiro trabalho, já em 1998 sob o nome de «Inocentes», com algum sucesso mas que não foi potenciado nem aproveitado com culpas para ambas as partes, cremos nós. Daí que em 2000 tenhamos acordado uma rescisão e quase de seguida assinado pela Som Livre de que resultou a edição de um novo disco «Sombra da Lua» já com o nome de Clark. Este CD inclui alguns temas que integraram novelas portuguesas mas teve um fraco airplay de rádio e coincidindo com o início da crise da indústria não nos levou à projeção ambicionada. Mais tarde esta editora encerrou e em 2006 decidimos avançar para uma edição de autor, até porque nunca deixámos de fazer canções… Só que estas coisas demoram muito tempo, as vidas de cada um vão sofrendo alterações e passaram mesmo muitos anos até se concretizar. Apenas em 2012 o CD ficou pronto. O interesse da Farol revelou-se entretanto após a audição de «Bipolar» e assim concretizámos esta ligação, primeira edição em formato digital que conta com mais de 10.000 downloads em todo o mundo e depois na edição física.

Os vossos primeiros acordes juntos aconteceram por volta de 1994. Houve uma grande evolução desde aí?

Claramente e de forma natural. Seria preocupante se não o sentíssemos e provavelmente já não andaríamos por aqui. O facto de termos passado por muitos palcos e trabalhado com muitas pessoas diferentes e com grau de exigência elevado obrigou-nos a evoluir. Entretanto para este trabalho, a grande evolução é sobretudo a liberdade e a autonomia com que foi feito. O facto de ser inicialmente uma edição de autor libertou-nos totalmente de pressões criativas, de prazos, ou de dar satisfações a quem quer que fosse que não a própria banda. Essencialmente os Clark têm mais alguns anos «em cima» mas daí apenas se retira o positivo, pois a energia e o entusiasmo são de principiantes e isso, achamos nós, reflete-se mais que nunca no som e canções da banda.

Foi necessário um grande esforço para conseguirem vingar no mundo da música?

A carreira dos Clark, não o podemos negar, tem tido altos e baixos, ou melhor momentos de aparição mais ou menos prolongados e outros de ocaso. 16 anos após a edição do primeiro trabalho, ainda não nos conseguimos impor de forma vincada no panorama musical português mas continuamos por cá e esse é esforço da persistência. Se olharmos para trás talvez tenhamos descurado algum envolvimento com a indústria musical investindo numa preciosa rede de contactos e passado muito tempo na sala de ensaios à espera que caísse do céu aquilo que nunca cai. No entanto acreditamos estar num ponto de viragem e à beira de inverter essa situação pois sentimos que ultrapassamos a esfera dos amigos e conhecidos e estamos diariamente a conquistar mais público. Isso é irreversível!

O que vos inspirou para criar «Bipolar»?

Pessoas, sentimentos e factos opostos amor/ódio rápido/lento apatia/excitação verdade/mentira, guitarras com delays analógicos, teclados vintage (mellotron, fender rhodes e hohner strings), melodias vocais dream pop, Doves, Morphine ou Arcade Fire, baterias bem captadas e um piano baby. Não temos qualquer relutância em afirmar que as nossas inspirações são muitas e muito vastas não só em termos musicais como literários. Somos mundanos e não fechados àquilo com que somos confrontados no quotidiano. Por exemplo, assistir a um determinado filme pode originar um esboço de letra, assim como uma vivência pessoal ou de um amigo. Os programas de autor de rádio como eram os de António Sérgio tiveram no seu momento um grande peso nas nossas preferências musicais e de certo modo sim, o nosso universo sonoro está mais ligado à música que se convencionou chamar indie ou alternativa mas não se esgota por aí. Achamos que isso se percebe ao escutar «Bipolar».

Qual a mensagem que «Bipolar» pretende transmitir ao público?

«Bipolar» é um disco agridoce. As canções de «Bipolar» falam-nos de relações entre pessoas, sentimentos, emoções, e estados de espírito por vezes antagónicos, numa perspetiva que tem como objetivo permitir que quem as escute se possa sentir em algum momento parte integrante ou protagonista das histórias relatadas. Daí surgirem temas como «Pequenos Nadas» que relata o peso e a influência que detalhes quase insignificantes que podem ter no curso da vida de cada um, ou a «Nudez» que se refere ao facto da imagem exterior nem sempre corresponder ao conteúdo. Essencialmente temos como ideal que as nossas canções mexam com as pessoas e lhes despertem o lado emocional.

Concertos ao vivo, para quando?

No decorrer dos meses de maio e junho tivemos sete atuações essencialmente nas Fnacs e todas na Grande Lisboa. Continuamos numa fase promocional com aparições na TV e temas do disco a passar em algumas rádios com o objetivo de virmos a tocar ao vivo. Os Clark são uma banda que adora tocar e fazer espectáculos estando próximos do público. É isso que nos realiza e os espectáculos que fizemos tiveram um acolhimento muito positivo do público o que nos encoraja sobremaneira.

Este ano fazem 20 anos de carreira. Qual a sensação de comemorar uma data, assim, tão especial? Esperam ultrapassar os 35 dos Xutos e Pontapés?

Não sabemos se tal é possível. São carreiras incomparáveis. Estamos num plano quase oculto face a uma banda como os Xutos. Nem sei se um futuro existirão bandas com carreiras tão longas. Provavelmente continuaremos a fazer música durante muitos anos mais. Mas não sentimos sequer esses 20 anos para o bem e para o mal com tantos que temos em que basicamente não aparecemos. Quando fizermos 20 anos sobre a primeira edição, provavelmente criaremos algum evento mas até lá temos «Bipolar» para explorar e é nisso que estamos focados.

O tema «Brilho Assassino» faz parte da banda sonora da novela da TVI Mulheres. Costumam ver os episódios, só para ouvirem a vossa música?

Confessso que já o fizemos à espera do tal momento de passagem na novela. Mas não estamos obcecados com isso. O facto do tema ter sido escolhido é para nós gratificante. É sinal também de reconhecimento, de que a nossa música tem história e é de algum modo cinemática.

Sentem que o vosso talento é reconhecido em Portugal?

O nosso talento tem sido reconhecido, devagar mas tem. Há muitas barreiras, preconceitos e resistências para abrir portas a artistas com um passado não muito visível, acontece que os Clark estão com muitas «ganas» e não esmorecem. Acreditamos na música que fazemos e que se chegar a mais pessoas muitas irão gostar e nessa altura reconhecer-nos como um projeto sólido, com identidade própria e de valor na música pop rock nacional.

As vendas de CD’s diminuíram drasticamente e o digital instalou-se, com ele o poderio das plataformas como o iTunes, Spotify, entre outros. O que me dizem sobre isto?

No streaming abrem-se perspetivas quase ilimitadas. A custo zero ou a um custo muito baixo é possível ter mais música em qualquer lugar e sem sobrecarga dos discos rígidos (vantagens evidentes sobre o download digital) para além do desincentivo radical que provocam nos atos de download pirata. No download só temos impressões positivas tal foi o número de downloads efetuados em todo o mundo de temas dos Clark (algo impensável nas edições físicas). O digital não nos assusta definitivamente. O negócio da indústria musical pode almejar atingir valores nunca antes alcançados, o futuro pode ser igualmente melhor para os artistas porque estes poderão eventualmente realizar mais dinheiro e ser vistos por mais pessoas que é no fundo o que os artistas desejam, reconhecimento e poder tocar para grandes audiências. Tudo isto levará o seu tempo, precisará de regras e legislação amadurecida mas não o vemos como uma ameaça. 

Como avaliam o atual panorama da música em Portugal?

É um momento de quantidade, diversidade e qualidade na música em Portugal.  Há inúmeros artistas em várias áreas musicais capazes de rivalizar com o que de bom se faz fora de Portugal. Ironicamente essa qualidade e diversidade não é assim tão replicada nos media. Já foi pior claro, mas continua a faltar um circuito, por exemplo a criação de salas para concertos que proporcionassem um circuito ao vivo descentralizado (por exemplo capitais de distrito) através dos espaços municipais ou universitários e onde os artistas pudessem apresentar os seus trabalhos. É um exemplo de uma medida mesmo que de difícil execução. Há esquemas e vícios difíceis de ultrapassar neste meio e para uma banda penetrar em certos meios é preciso muito mais que música.

Aborrece-vos o facto de videoclipes de concorrentes da Casa dos Segredos terem mais destaque (impacto e visualizações) do que outros vídeos mais sérios?

Não. A visibilidade e a notoriedade fazem isso mesmo e são factos incontornáveis. Os Clark não estarão no grupo de pessoas seguidoras desse tipo de vídeos mas a sociedade vive um permanente Big Brother e quer espreitar  e comentar o que se passa na vida dos «conhecidos» ou «famosos»”. Para nós isso poderá apenas servir para escrever um tema e provavelmente bem ácido… (risos).

Qual a vossa opinião sobre talent shows como Factor X, The Voice ou Rising Star? Estes programas ainda fazem sentido?

Nada temos contra, são programas de entretenimento com intérpretes e há alguns muito bons que cantam temas alheios demonstrando o seu potencial vocal, tudo isto numa produção que explora também as vidas pessoais, dramas e alegrias de cada um. Uma espécie de Big Brother de cantores. Estes programas fazem sentido enquanto as audiências o justificarem em canais de televisão comerciais, não sabemos se o mesmo se aplica em relação aos canais públicos. São fórmulas testadas noutros países com sucesso e audiências até que nova edição apareça e «abafe» os intervenientes anteriores… quais cinco minutos de fama que alguns conseguem capitalizar durante mais algum tempo.

Muito obrigado pela entrevista. Desejo-vos o maior sucesso, e não se esqueçam: nunca sejam «bipolares» em relação aos vossos sonhos.

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Os Clark depositam no álbum «Bipolar» a confiança de um terceiro trabalho e o entusiasmo de um primeiro.
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