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A Entrevista РHerman Jos̩

A Televisão
10 min leitura

Destaque2 Hermanjos%25C3%25A9 A Entrevista - Herman José

É um dos rostos mais mediáticos da televisão portuguesa. Tem 60 anos bem vividos e 40 de uma carreira cheia de genialidade. Figura incontornável do panorama artístico nacional, aquele que é agora o apresentador do Há Tarde, da RTP, revolucionou o humor em Portugal e mostrou ser um artista dos sete ofícios. Personagens como Tony Silva, Serafim Saudade, Sr. Contente ou Maximiana são inesquecíveis. Em conversa com o A Televisão, Herman José fala sobre o passado e o presente – o seu e o da televisão –, mas também sobre a inevitável passagem do tempo.

1 A Entrevista - Herman José

Como é que está a correr este novo desafio televisivo, o Há Tarde?

Quando me fizeram este desafio, ele pareceu-me aparentemente giro, porque de repente veio-me à cabeça a Ellen e a Oprah. Mas esqueci-me de uma coisa muito importante: é que estes programas tipo Ellen e tipo Oprah têm uma hora de duração, não têm três. E portanto, depois pensei: bom, o desafio é muito grande, vamos lá ver. Como nós não temos direito aos mesmos temas fraturantes da concorrência, porque queremos manter-nos numa espécie de feel good TV, eu temi que morrêssemos em fade out algures entalado entre os dois canais no horário. Felizmente isso não aconteceu. Arranjámos uma personalidade própria e hoje em dia temos esta felicidade de ver que as pessoas querem muito vir ao programa e que levam o programa muito a sério.

O programa tem tido boas audiências e está a aproximar-se cada vez mais do líder A Tarde É Sua. Isso dá um orgulho muito especial.

Nós temos alguns dias em que os conteúdos são tão explosivos que assustam a concorrência, mas não acontece sempre. Este público da tarde é muito «zappeiro», gosta muito de andar a viajar de um lado para o outro. E já senti, quando os nossos programas são menos abrangentes ou mais específicos em certas áreas, nós fragilizamos um bocadinho. Mas o que nós não vamos fazer é andar atrás da voragem das audiências, porque senão começamos a atraiçoar aquilo que nós queremos para as nossas tardes – que é só fazer boa televisão, mais nada.

Não vivem obcecados pelas audiências.

Nem pensar. Vivemos obcecados pela qualidade do programa. Quando chego ao fim do programa e sinto que ele não foi o que eu achava que ele podia ser, mesmo que as audiências sejam boas, tenho sempre uma reunião e digo que não gostei nada do programa de ontem; vamos lá ver o que nos falhou. Estamos sempre em cima do acontecimento.

O Herman é um homem cheio de recursos (ator, cantor, músico…). Isso ajuda num programa deste género?

No fundo, o que eu faço é fingir que estou em casa. Isto é a sala, às vezes levo as visitas até à cozinha. Quando me sento ao piano é sempre com a mesma lógica de que estou em casa a brincar. E quem depende da nossa companhia, que são muitas pessoas, é como se a tarde de repente lhes fizesse sentido e eles saíssem da solidão da casa para dentro de uma outra casa onde estão pessoas.

O telespetador deixa-se envolver, porque o programa é tão informal mas tão cultural ao mesmo tempo. E o Herman tem tanto conhecimento e tanto para transmitir…

É a única vantagem da passagem do tempo, porque a passagem do tempo não tem piada nenhuma, como oportunamente perceberás. A passagem do tempo é sempre perda de coisas, da visão, de faculdades, da beleza física, de uma quantidade de coisas. A grande compensação que a natureza nos dá em troca é podermos adquirir conhecimento. E portanto, quanto mais tu puderes saber e mais puderes transmitir e mais te preocupares com o conhecimento, mais feliz e útil te tornas enquanto cidadão sénior. O pior que pode acontecer é «ai não me interessa, não quero saber». Eu quero saber de tudo!

Este programa veio na hora certa, com a maturidade certa, com o conhecimento certo?

Sinto que é uma luva que me calça perfeitamente. E tem a ver com a minha lógica de cultura, porque eu não sou extraordinariamente culto em nada específico, a minha cultura é completamente abrangente.

Tal como um programa deste tipo.

Sim. Eu não sou especialista em literatura, não sou especialista em música, não sou especialista em nada. Mas tenho um interesse abrangente por tudo. Portanto, acho que estou no sítio certo.

Nunca há falta de conteúdo e muitas vezes sinto que se fosse preciso o Herman estava ali cinco horas a falar com aquelas pessoas.

Então imagina daqui a dez anos, quando tu fores uma grande vedeta. Quando eu te for entrevistar, já temos um passado.

Já temos alguma coisa para contar.

Estamos a fabricar o nosso próprio passado. Hoje estava a ver aquela fotografia entre a Amália e a Lauren Bacall, que foi uma das grandes divas do cinema americano, e estava a pensar que tive direito realmente a uma longa e profícua carreira cheia de acontecimentos, e numa fase em que ainda havia muito dinheiro para gastar. Nos anos 90 mandávamos vir Cher, Kylie Minogue, Tom Jones. Havia dinheiro para tudo.

Já conhecia a Vanessa Oliveira?

Conhecia só daqueles encontros dos programas que ela fazia para a SIC. Tinha um carinho normal por ela. Nunca tínhamos sido íntimos. O nome dela não me foi proposto, foi ditado. Depois, só descansei porque nós temos amigos comuns e todos eles me diziam: «Vais adorar. Ela é muito querida e muito boa pessoa». Quando alguém tem a fama de «boa pessoa» não é por acaso, é porque há qualquer coisa que funciona bem. Efetivamente, todas as nossas grandes diferenças e dúvidas, com a continuação, foram-se tornando num agradável companheirismo. Neste momento eu acho que já somos família.

A Vanessa é quase como uma esponja. Muitas vezes está a observar e a tentar recolher tudo.

Já me anda a roubar expressões e ideias. Possivelmente vai acabar em tribunal.

Pois, acho que sim [risos]. E até tem sido criticada na internet: «Afinal, é apresentadora ou espetadora?»

Ela andou à procura do seu espaço. É muito duro. Imagina: recebo um ator com quem eu trabalho há quarenta anos e, de repente, tens uma pessoa que tem menos vida e tempo de conhecimento que eu tenho com a pessoa… É muito difícil interagir numa situação destas. Se estiveres em casa a conversar, é uma coisa. Se estiveres a fazer um programa, é outra. Portanto, há momentos um bocado embaraçosos, que ela se habituou a assimilar e que com o tempo vão estando cada vez mais diluídos à medida que o programa for crescendo e a nossa relação se for cimentando.

Sente que a certa altura não foi reconhecido por todo o trabalho que já fez ao longo do tempo?

Todas as carreiras são ciclos. Não há carreiras ou sempre a subir ou lineares, não. Engordas, depois emagreces. Tens sucesso, depois já não tens…

Isso fê-lo reinventar?

Não. A vida tem de ser vista assim. Quer dizer, nas outras profissões é igual. Pega num médico de sucesso da minha idade: se calhar teve um processo em tribunal por uma má prática médica porque teve um acidente, teve uma fase em que a mulher o deixou e levou o dinheiro todo, depois teve outra que esteve doente… A vida é mesmo assim. E quem achar que não é, está tramado. Quem acha que a vida é um contínuo de sucesso ou de felicidade, é inconsciente e vai sofrer imenso. Eu estou preparado para tudo, mesmo para as piores coisas. Enquanto estiver vivo, nada me pode abalar. Mas nada, literalmente nada, porque tenho a perspetiva da vida muito pós-segunda guerra. Desde sempre que tenho a noção que todos os dias são importantíssimos, independentemente daquilo que nos aconteça.

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